Por Fernando Lara
O terceiro dia do Foto em Pauta Tiradentes – e, na prática, o último – foi o mais movimentado deles. A cidade acordou bem mais cheia do que nos dois primeiros dias, uma vez que muitos chegaram na noite de sexta ou logo cedo no sábado. O tempo permaneceu quente e sem chuvas, para sorte da organização, que pode contar com a projeção de todas as palestras em um telão instalado num simpaticíssimo jardim. No caso da principal atração do Festival, o encontro de J.R. Duran e Bob Wolfenson, mais de 200 pessoas acompanharam o bate-papo do lado de fora, sob as bênçãos da lua cheia. Mas falo disso num minuto, porque a agenda do dia foi bastante movimentada.
O dia abriu com um Ciclo de Ideias cujo tema era Fotolivros – Memória Contida, com Valdemir Cunha, Iatã Canabrava e mediação de Alexandre Belém. Em seguida, houve uma bela palestra de Patrícia Gouvêa trazendo Um Olhar sobre a Fotografia Carioca. Os workshops seguiram normalmente e, às 16h, houve o Encontro do Fórum Mineiro de Fotografia. O Foto em Pauta continuou com uma conversa com o fotógrafo mineiro Gustavo Lacerda, comentando a sua obra, entre elas o premiado ensaio sobre os Albinos. O tema do trabalho autoral também foi discutido no segundo Ciclo de Ideias do dia com o tema Autores – Reverberações e Tempos com João Castilho, Pedro David e Pedro Motta. Ainda tivemos o lançamento do livro Tiradentes – Um Olhar para Dentro com o trabalho de Cristiano Mascaro e Humberto Werneck até a hora de ver Bob Wolfenson e J.R.Duran entrevistados por Alexandre Belém e Marília Scalzo. Eles falaram sobre Revistas de Fotógrafos.
Impossível apresentar informações sobre todas as atividades, uma vez que me encontrava no workshop “A Cidade”, do apaixonante Cristiano Mascaro. O fotógrafo, cuja obra tem o espaço urbano como ponto central, apresentou e comentou sua trajetória profissional, exibindo as imagens, o conceito de produção e divulgação de suas obras e, principalmente, seus projetos editorias. Entre a manhã e a tarde, um agradável almoço fotográfico com Miguel Aun, um dos mais respeitados fotógrafos mineiros, com extensa cobertura da paisagem e da gastronomia do Estado.
As Mostras
Um ponto que certamente terá novas atividades na próxima edição do Festival são as mostras, projeções e exposições paralelas. Tenho certeza que a maior parte dos fotógrafos mineiros que estiveram na cidade pensou “por que não me articulei para expor aqui?”. Alguns, mais atentos, efetivamente fizeram isso. Vale destacar as projeções do fotógrafo e editor de fotografia Leonardo Lara, com seu ensaio “Pescadores”, a Projeção “Beagá em Foco”, realizada pelo grupo de fotógrafos Fotochá e a deliciosa e inesperada exposição, em um dos mais simpáticos becos de Tiradentes, do fotógrafo Pedro Silveira, com o trabalho “Rosário”. Vale ainda destacar uma caminhada fotográfica na Serra de São José, que protege Tiradentes, como uma idéia muito bem recebida pelos participantes.
Espaço Nitro
Outro ponto interessante foi a parceria do Festival com a Agência Nitro, responsável pela cobertura oficial do evento e que ofereceu um dos melhores espaços da cidade, com o lançamento de livros, exposições, centro de impressão em parceria com as empresas Solução e Imagem, HP e Hahnemühle. Todos os participantes dos workshops tinham direito a uma ampliação A3, que poderia ser feita durante o Festival. E, porque ninguém é de ferro e merece uma socialização, as melhores festas aconteciam lá também, até o dia seguinte.
Revistas

Wolfenson lançou dois livros e deu um workshop em Tiradentes. “Ser fotógrafo da playboy é como ser “ex-BBB”, o estigma fica para sempre e você tem que responder perguntas sobre a sua rotina na revista”, disse.
E como estrela da noite, do dia e talvez até do Foto em Pauta Tiradentes, o embate dos projetos editorias de J.R. Duran e Bob Wolfenson, dois dos fotógrafos brasileiros mais reconhecidos (pelo grande público) da atualidade. Wolfenson já havia aparecido na noite anterior e ministrado uma oficina ao longo do sábado. Duran, por sua vez, chegou na hora marcada. O primeiro lançou a revista S/N, que já tem 13 edições. O segundo, a Revista Nacional, em sua primeira edição.
As duas revistas apresentam grande sofisticação estética, padrão de impressão invejável e o foco em questões brasileiras. Diferem-se, no entanto, na forma de fazê-lo: Wolfenson convida outros fotógrafos e artistas enquanto Duran faz todas as imagens de sua revista, convidando apenas os jornalistas / redatores / escritores para os textos que as acompanham. Um detalhe: nenhum redator tem acesso às fotos antes de finalizar o texto para evitar que o texto se refira às fotos e não ao tema.
O projeto de Duran usa somente uma fonte (preta, com títulos em vermelho), fotos em P&B e não traz anúncios. Pesa 1,5 quilos. A idéia do fotógrafo é produzir uma edição por ano ao longo de 10 anos e distribuí-la para públicos de interesse. A revista de Wolfenson já está mais próxima do padrão editorial, apesar da sofisticação. É possível até esbarrar com uma delas por aí, numa banca ou na casa de um amigo designer. A de Duran, não. Em suas palavras, “é como um clube”.
Os dois concordam na motivação: iniciaram os projetos para fazer o que gostam e mudar a lógica de “subaproveitamento” do potencial dos fotógrafos pelas publicações tradicionais. Ponto para eles nesse item. Nesse playground de processos imaginativos, o conteúdo nacional é valorizado, mas de uma forma bastante restrita. Na busca pela fuga da armadilha tradicional do processo de customização das revistas, que segundo Duran “contam o que eu já sei”, ambos os fotógrafos “criam espaços para encontros improváveis”.
O clima do encontro começou ligeiramente pesado. Não sei bem se por parte deles ou do próprio público, que discutia como era – efetivamente! – a relação dos dois fotógrafos. Bob Wolfenson mais solto e Duran um pouco indiferente. Com o passar do tempo, e com a boa mediação de Alexandre Belém, tudo se assentou. O Festival terminaria sem qualquer incidente.
Fechamento
No domingo, às 11h30, sem muito sucesso junto ao público – que ainda se recuperava das festas de encerramento –, uma apresentação das fotos produzidas nas oficinas do Festival. Logo depois, aquela sensação de quarta-feira de cinzas, com uma tristeza bem tangível e uma curiosa nostalgia de um festival que tinha acabado de nascer.

Fernando Lara e a colega Ana Lira em Tiradentes: felizes com a colaboração dele no blog | Rafael Motta
Uma ótima primeira edição do Foto em Pauta Tiradentes. Destaque para o espírito colaborativo de muitos, que reconheceram a importância do projeto, mas, principalmente, para o papel de Eugênio Sávio. Tomo emprestadas as palavras da equipe da Nitro, que sintetizou muito bem o que aconteceu em Tiradentes: “demorou um bocado, mas depois de muita insistência e com o apoio de todo mundo que pode ajudar, o fotógrafo, produtor cultural, professor e pai de três filhos, Eugênio Sávio, finalmente vai conseguir tirar do papel um sonho antigo. O Festival Foto em Pauta Tiradentes vai colocar Minas Gerais definitivamente no calendário de eventos ligados à fotografia no Brasil”.
E pra me despedir, um agradecimento especial para as meninas do 7, que me deram a chance de cobrir, pela primeira vez, um festival de fotografia e a honra de participar como primeiro convidado.
Vida longa ao projeto!
Fiquei com água na boca pra uma próxima edição. Aliás, brilho nos olhos seria uma expressão mais exata! Valeu, Fernando!!
Foi tão bom ficar por dentro do que rolou no Festival pelas suas palavras, Fê. Ainda mais em forma de texto, não em meio à conversas, cheias de interrupções.
Mas enfim, vida longa ao festival.
PS.: Invejinha dessa foto. Queria tá nela também. rs
Falta de convite não foi =)