Há um tempinho atrás circulou na internet um vídeo que, depois de ter me provocado algumas boas risadas, acabou despertando em mim uma série de questionamentos. Muitos de vocês devem ter esbarrado pelas redes sociais com o vídeo de PC Siqueira jogando um baita balde de água fria nas pessoas que acham que são fotógrafa por terem uma câmera fotográfica. Se não viu ainda, dá o play ai embaixo. E mesmo que já tenha dado uma espiadinha, assiste de novo, tentando deixar o lado cômico da história um pouco de lado, vale a pena.
Sim, é uma piada. Uma piada cheia de verdades e não verdades. E que me deixou algumas semanas bem inquieta e me fez pensar em escrever esse #Diálogo. Uma das principais questões que ficou pairando em meu pensamento foi o porque de tantas pessoas quererem ser fotógrafas. Conversei com um monte de gente durante o processo de produção desse texto e cheguei a conclusão de que ser fotógrafo está na moda. Não falo do romantismo que sempre rondou a profissão, em que muitas pessoas viam os fotógrafos quase como seres especiais, que enxergavam o mundo de maneira diferente, verdadeiros alquimistas que se trancavam em seus laboratórios e saiam de lá com imagens incríveis. Esse tipo de encantamento sempre existiu. O que tenho me dado conta é que não se tem visto os fotógrafos apenas por essa perspectiva, ser fotógrafo tem sido sinônimo de popularidade.
Acredito que essa forma de enxergar a profissão está bastante relacionada a maneira como os fotógrafos são representados na ficção.
No cinema, os fotógrafos são quase sempre enigmáticos, introspectivos e ainda assim atraem os olhares e despertam admiração por onde passam. Um ótimo exemplo dessa complexidade fascinadora é o filmes Blow Up, clássico Michelangelo Antonioni (se você ainda não viu, veja assim que acabar de ler esse texto). A história gira em torno de Thomas, um fotógrafo de moda londrino arrogante, insensível e extremamente sedutor. É uma personagem tão dúbia, tão profunda que apaixona, instiga e que influenciou muita, muita gente a seguir a profissão.
Falando no contexto nacional, eu diria que as telenovelas tem grande responsabilidade em difundir essa visão “pop” da profissão. Eu, que não costumo assistir televisão, pensando rapidamente, me lembro de umas cinco personagens fotógrafos, só nas novelas mais recentes da Globo. Todos belíssimos, inteligentes, bem relacionados, bem sucedidos. Jorge Tadeu, fotógrafo sedutor, interpretado por Fábio Júnior, que enlouqueceu as mulheres da pequena Resplendor (e praticamente do Brasil inteiro), na novela Pedra Sobre Pedra, exibida em 1992, talvez seja um dos maiores exemplos desse estereótipo que tem se feito da profissão.
E existe algo mais pop do que um super herói, nerd, tímido, metade homem, metade aranha, fotojornalista que faz autorretratos de suas boas ações e as publica no jornal? Ou do que Valentina Rosselli, fotógrafa sexy das histórias em quadrinhos eróticas do italiano Guido Crepax?

Valentina | Guido Crepax
Saindo da ficção, mas de certa forma, permanecendo nela, tem acontecido um fenômeno bem interessante: fotógrafos tem se tornado celebridades e aparecido mais na frente das câmeras do que por trás delas. É o caso do polêmico e incrível fotógrafo americano Terry Richardson. Sempre que penso em Terry, vejo uma imagem dele e não de sua fotografia. Por mais que eu não fique imune às suas fotos e ache o trabalho dele genial, não tem jeito, de primeira, só me vem sou rosto na memória. E acredito que isso não aconteça apenas comigo.

Terry Richardson na Purple Fashion Magazine
Diante de todo esse “glamour” em torno da profissão não é de se estranhar a enorme quantidade de pessoas interessadas em entrar para o ramo. Em uma rápida busca no Google com a frase “como ser fotografo” encontrei aproximadamente 36.500 resultados, que incluem todo o tipo de manual, dicas, tutoriais. Mas, o que me chamou realmente atenção, foi a busca que fiz no Yahoo! Respostas. Foram 437 resultados e trago para vocês alguns que se destacaram:
Em quase todas as respostas o danado do equipamento fotográfico apareceu como uma determinante no “se tornar fotógrafo”. Ai aparece a parte do vídeo de PC Siqueira que eu concordo: ter uma câmera fotográfica não faz de ninguém um fotógrafo. Ter uma câmera cara não faz de ninguém um fotógrafo melhor. A fotógrafa Adelaide Ivánova, que passou recentemente aqui no #FlickrWeek, escreveu em 2009, em seu blog, um texto incrível e divertidíssimo sobre essa questão do equipamento. Resumindo muito a história, Ivi conta uma situação em que no meio de um trabalho, uma menina se aproximou puxando assunto sobre fotografia e acabou falando que também tinha uma câmera e que a tal câmera era melhor do que a dela. O texto é antigo, talvez Ivi nem pense mais dessa forma, mas eu acho bem relevante esse trechinho:
“(…) depois, no decorrer da foto, essa moça ficou contando pra irmã dela que tinha comprado cinco bolsas da chanel na semana anterior, que tinha gastos não seis quantos mil reais na nk store no dia anterior e que no dia seguinte ia na daslu comprar um vestido de não sei qual marca gringa que ela tinha gostado. a mulher só fez falar das coisas que ela tinha ou queria comprar.
aí entendi que, para essa moça, ter uma 5D é tão importante quanto ter uma bolsa chanel para se amostrar. ela não quer saber do que ela precisa, ela quer saber do logo, do charme que ela pode fazer com aquela porra a tiracolo.
qual a graça de se amostrar com uma digitalzinha de seis mega? nenhuma! assim como não dá nenhum status andar por aí com uma bolsa da c&a. (…)”
É isso que tem acontecido. A câmera virou um acessório de luxo. Como uma bolsa, com sapato, um perfume. Algo que as pessoas tem usado para chamar atenção. Fazer fotografia é só um detalhe, um plus a mais. Sem falar que fotografar tem se tornado cada vez mais simples, você clica e pronto, está ali uma bela imagem. Hoje em dia tem se produzido fotografias muito bem resolvidas esteticamente quase que por acidente. Acredito que é justamente essa facilidade que tem feito tanta gente se considerar fotógrafo por ai. A lógica é bem simples: se eu posso comprar uma câmera cara, bem robusta, que faz imagens incríveis com apenas um click, automaticamente eu sou fotógrafo.
Durante muito tempo eu tinha uma visão bem romântica em relação aos motivos pelo qual uma pessoa resolvia se tornar fotógrafo. Claro que ainda existe muito encantamento pela fotografia, pela linguagem, pela estética… Mas tenho percebido, de uns tempos para cá, que o que tem levado as pessoas por esse caminho são dois fatores: o status e o dinheiro (as pessoas ainda acreditam que fotógrafos são ricos, doce ilusão).
Recentemente aconteceu um fato bem desagradável aqui em Recife. Um pessoa começou a circular se apresentando como fotógrafo. A princípio só mais um na multidão. Até que se descobriu que ele estava publicando no Flickr e Facebook fotos de diversos fotógrafos do país inteiro, como suas. Esse não é o primeiro caso de uso indevido de imagem e nem será o ultimo. Mas fiquei pensando bastante no porque desse tipo de comportamento. Será que ele queria realmente entrar para o mercado, se tornar um fotógrafo de fato? Sou mais pela hipótese de que ele simplesmente queria ter o status de fotógrafo. Pouco importava produzir, pouco importava a fotografia em si. Imagino que a intenção dele era apenas passar na rua e ser reconhecido como um profissional. Como diria Ivi, ele queria se amostrar. O que depois desse episódio, vai ser bem difícil.
Lendo o último #Diálogo de Bella Valle, fiquei me questionando muito sobre essa questão de ser ou não ser fotógrafo. Quebrei muito a cabeça e não consegui definir muito bem em mim o que determina isso. André Rouillé, de maneira bem direta e um tanto conservadora, joga ainda mais lenha na fogueira:
“Não basta fazer fotografias, tirar fotografias para ser fotógrafo, o que o fotógrafo faz alcança muito mais do que imagens fotográficas. Em primeiro lugar, o fotógrafo é o herdeiro de uma cultura, de uma ética visual e profissional. O fotógrafo também é, consciente ou inconscientemente, adepto de um regime de verdade, isto é, ele acredita que se pode acessar uma verdade do mundo a partir de suas aparências. Muitas pessoas fazem fotografias sem serem fotógrafos, por exemplo, amadores. Acho que as fotos de família são fotos, mas isso não quer dizer que eles sejam fotógrafos”.
Eu penso muito parecido com Bella, acho que a questão vai mais além e aquém:
“Ser fotógrafo vai além de qualquer equipamento; vai além de integrar certos grupos sociais; vai além de ter “realidades” e personagens legais para fotografar; vai além de ganhar ou não dinheiro com isso; vai além de já ter entrado em um laboratório; vai além de usar ou não o Photoshop; vai além dos clichês; vai além dos estudos; vai além de se ter um Flickr ou um site legal para mostrar seus projetos, clientes e trabalhos; vai além da mágica; vai além da técnica; vai além do que você acha sobre si mesmo.”
O importante é ser e não “ter”. Se você quer ser fotógrafo fique certo de que ter um equipamento não vai te fazer um fotógrafo. Mas ter consciência disso é um bom começo e já te aproxima mais da realidade.
Excelente texto.
Eu ia complementar com algumas coisas que tenho visto por ai porém não vai acrescentar muito.
conta, marcos, só pra gente esticar o assunto. sempre acrescenta! 😀
Essa é uma ótima discussão meninas! Tenho um tio que toda vez que me vê com a câmera pergunta se eu vi a super lente que ele comprou e mostra com as mãos o tamanho dela, como se o tamanho da lente fosse o suficiente pra fazer boas fotos (e no fundo sei que ele tá questionando como eu trabalho com fotografia se uso essa lente tão pequena – 50mm – enquanto ele tem uma lente melhor que a minha, pois é maior). O mesmo se esquece que voltou de sua última viagem de Paris reclamando que as fotos não saiam boas pois não sabia mexer na câmera. É claro que ele não tem nenhuma pretensão de ser fotógrafo, mas esse pensamento de que o melhor aparato tecnologico é que faz a melhor foto é bem comum.
Achei bem interessante o que o Danielo Siqueira colocou em seu blog – http://www.letsvamos.com/letsblogar/2011/08/23/sempre-a-camera/ – ri, mas no fundo é bem verdade.
Beijos
Acho que meu pai ficou mais feliz do que eu, quando comprei a minha 70-200mm branquinha.. Ele repetia com um sorrisão no rosto “essa lente é muito boa! olha como ela é grandona! agora sim tu é fotógrafa pra valer com essa lente”! Hahahaha
Por isso, Mari, que tem dias que me divirto à beça lendo os tweets do Fotógrafo Cuzão… http://www.twitter.com/FotografoCuzao
É uma coisa meio extremada, verdade, mas é baseado nessas concepções erradas que ele dá as alfinetadas homéricas dele. Eu mesmo me lembro de quando um sujeito me viu com uma 17-55mm 2.8 e por causa do tamanho dela me abordou perguntando:
– Essa aí vai buscar lá longe, hein?!
Tive vontade de responder que lente não é cachorro, sério.
Massa mesmo.
Acrescentando um pouco a charge: – Ótimas fotos! Que equipamento você usou?
– Um cérebro, um olho, um dedo e um coração.
Penso que fotografia vem muito do afeto. De você sentir que aquilo deve ser registro e visto, revisto, revisto. O melhor equipamento de um fotógrafo é ele mesmo.
Parabéns, pelo texto, vibrei em algumas situações, gostaria de poder gritar e mostrar por ai, (in)felizmente temos só este tipo de ferramenta para mostrar a todos.
Tá! Eu sou bem tímida e nunca comentei por aqui porque vocês são cabeças demais e eu não sei falar bonito assim… rs (brincadeira heim!)
Mas esse é um assunto que eu sempre me pego pensando. O que é ser fotógrafo? E eu nunca chego em lugar nenhum.
Já acreditei na questão: Fotógrafo profissional é aquele que ganha dinheiro com fotografia, seja ela boa ou não. E o fotógrafo amador aquele que faz porque ama – como o próprio nome sugere-, seja ela boa ou não.
Acontece que eu não gosto de rótulos e essa frase, apesar de achar que tem sua razão, nunca me bastou.
Volta e meia alguém vira pra mim e diz: “…você, como fotógrafa profissional…” Ai, detesto ouvir isso. E é aí que eu percebo o quanto aquela frase não diz verdades a mim. Porque apesar de ganhar din din com fotografia eu não me enxergo como fotógrafa profissional. Eu simplesmente fotografo e não curto ser rotulada por isso. Eu fotografo porque amo imagens, eu fotografo porque gosto de registrar momentos que eu sei que não voltam. Porque gosto de “colocar” numa imagem estática toda a magia que envolve congelar um momento e revivê-lo toda vez que olhar pra ele.
Eu fotografo só por isso? não sei! Eu sei que esse ato me encanta e tudo mais que envolve a fotografia, procurar a melhor luz, o melhor ângulo pra registrar aquilo de acordo com a minha visão de mundo. E quantas vezes eu faço isso sem estar com a câmera nos olhos. Faço isso mentalmente.
É, de fato não é a câmera que eu tô usando que vai determinar nada disso!
Tenho fotos feitas com caixinha de fósforo que eu amo, que falam de mim, para mim, que me despertam sensações e emoções. assim como tenho fotos feitas em estúdio com câmera legal, iluminação profissional, luz fotometrada, rebatida lá lá… e que não me dizem nada!
Vejo imagens por aí feitas com toda sorte de câmeras que me deixam com risinho de cantinho de boca ou me deixam angustiada, que falam pra mim! Assim como vejo imagens feitas com megapowers câmeras e que pra mim não têm valor.
Nunca tive uma câmera nova, minhas câmeras sempre foram usadas do marido e nunca fiz questão de tê-las. Nunca fiz curso de fotografia, mas sempre busquei conhecer e aprender sobre, porque sim! Pra fotografar é necessário conhecimento! Mesmo que esse conhecimento seja adquirido com as suas próprias experiências e observações, erros e acertos.
É difícil rotular e encaixar as coisas… mas acho que isso tudo que tu disse aí tá bem no caminho do que eu penso, ser fotógrafo vai além de muita coisa. Hoje, eu acredito que é muito mais ligado ao sentimento, à relação que se cria com o ato de fotografar.
Mas eu acho que isso nunca vai ficar tão claro, pra mim é uma daquelas coisas que não precisam de definição… pra mim é mais importante “fazer” que buscar rótulos.
Acho que tu tb é cabeçuda, Eva.:P Espero que comentes mais por aqui, gostei bastante do que tu disse. 🙂
Bom texto e ótimos questionamentos. Dia desses, aqui no Candela, recebi um email de uma pessoa interessada em fazer o nosso Curso Básico I perguntando se, após o curso, ela seria “fotógrafa profissional”. De verdade, fiquei sem saber o que responder, pois, o que determina o “profissional” do fotógrafo? Recorri ao Google e ele não me ajudou (se você coloca fotógrafo+profissional na área de pesquisa aparece uma imensa lista de fotógrafos que se intitulam profissionais). Talvez, bem talvez mesmo, a falta de um processo padronizado para determinar que um sujeito é fotógrafo ajude nessa proliferação de fotógrafos “zé bob”.
Concordo que a fotografia é charmosa como é por conta do romantismo que tem e, acho que sempre terá. Um dia, o jornalismo também foi assim e acho que hé redutos de romantismo nele. Mas, acho que o mínimo de critérios para a formação desse profissional deveria ser atendida, afinal de contas, fotógrafo também não é um profissional de comunicação? E não falo somente do fotojornalista. Eu já fiz cursos, estudo, leio e fotografo, e não me considero fotógrafa. E, bem da verdade, não sei exatamente o motivo de não me considerar assim.
E quem é fotógrafo profissional e por que? Por que uns são e outros não? Quem disse que você é profissional? Etc.
Até agora, procuro a resposta para a pessoa interessada em nosso Curso Básico I. Intimamente, acho que ela não seria. Quem me ajuda?
Beijos, Sam.
A globalização da comunicação também contribui com o crescimento de muitas outras práticas. Isso não acontece só com a fotografia. Inúmeras pessoas hoje possuem blogs de e se acham jornalistas. Com essa difusão de informações, coisas assim iam acontecer de qualquer forma. É fruto do que nós vivemos hoje.
Difícil não ter uma visão romântica do fotógrafo. As melhores fotos são aquelas nas quais se nota que há sentimento – tanto por parte do fotógrafo, quanto da cena fotografada. Não adianta só técnica, não. E o mesmo que um cantor que toca e canta uma música que diz ‘eu te amo’ do começo ao fim, mas que não se sente nenhuma emoção nem do autor, nem no cantor, nem da melodia, nem em nada. Mas sempre vai ter alguém que goste, né?…
Bruna, Evinha e Sam.. tenho pensado muito nessa coisa do que é ser fotógrafa. Como escrevi no texto, ainda não consegui definir isso muito bem em mim, não com palavras. Mas com sentimentos essa questão é bem clara.
Faço uma analogia meio piegas, mas que define bem isso: a minha relação com a fotografia é como um relacionamento amoroso, em que existe admiração, respeito, troca, amor e conflitos também, porque não. E no dia a dia isso me alimenta, me instiga, me alegra, me provoca, me angustia…
A fotografia encanta por isso é muito fácil se apaixonar por ela.. e eu acho isso ótimo. Acho lindo realmente ver um monte de gente se interessando, querendo comprar máquina etc etc.. Até brinco dizendo que o mundo seria mais bonito se todo mundo fotografasse.. Mas é aquela coisa ne? Não basta ter câmera, não basta gostar de fotografia, não basta fazer fotos bonitas. Acho que o grande diferencial nessa história é o respeito. Respeitar respeitar o mercado, respeitar o nosso trabalho e o trabalho dos outros, respeitar linguagens, respeitar os meios.. Enfim, acho que a definição do “ser fotógrafo” caminha por ai..
Pois é, tem que ter respeito também, de ambas partes: tanto do pessoal que é profissional da área pelos que portam singelas compactas e usam modos automáticos quanto destes por aqueles.
Por isso é bem legal quando gente com mais experiência resolve ensinar pro pessoal novato na sua área (por área falo tanto “fotografia” quanto “em sua área de fotografia, como social, paisagem…”) e o pessoal mais novo procura ver as técnicas e filosofias por trás dos cliques profissionais, e parar com o mito de que é o equipamento fotográfico, e seu tamanho, que fazem a qualidade das fotografias.
Pri,
grande texto. Concordo em gênero, número e grau. As pessoas querem aparentar que são. Querem status. Tanta bobeira !
Achei ótima sua comparação sobre câmeras e bolsas, nunca havia pensado nisso. Realmente, agora câmeras são acessórios de luxo ! É tanta ilusão junta que assusta.
Gostei também do que vc disse sobre a sua relação com a fotografia. Sinto parecido. E, no momento, eu e meu amor estamos em crise…rsrsrs. Estou reavaliando tudinho!
Beijão !
Pri,
lembrei de algumas passagens de susan sontag, no primeiro capítulo de “sobre fotografia”, que acho que dialogam bem com tua reflexão:
1) “Em época recente, a fotografia tornou-se uma passatempo quase tão difundido quanto o sexo e a dança – o que significa que, como toda forma de arte de massa, a fotografia não é praticada pela maioria das pessoas como uma arte. É sobretudo um ritual social, uma proteção contra a ansiedade e um instrumento de poder.”
2) “Assim como as fotos dão às pessoas a posse imaginária de um passado irreal, também as ajudam a tomar posse de um espaço em que se acham inseguras.”
3) “A própria atividade de tirar fotos é tranquilizante e mitiga sentimentos gerais de desorientação que podem ser exacerbados pela viagem. Os turistas, em sua maioria, sentem-se compelidos a pôr a câmera entre si mesmos e tudo de notável que encontram. Inseguros sobre suas reações, tiram uma foto.”
tenho procurado ser otimista quanto ao futuro. imagino que o grupo de fotógrafos e o grupo de pessoas que simplesmente tiram fotos ficará mais bem delineado a medida que comece de fato a fazer efeito o legado deixado por cada oficina, curso, graduação e pós-graduação em fotografia concluída. quase todo mundo fotografa hoje em dia, mas graças a esses espaços didáticos também cresce o número de pessoas “contaminadas” pelo conhecimento por trás da fotografia; gente que ingressa numa turma pensando uma coisa e sai dela com uma opinião bem diferente sobre fotos, muito afim de compartilhar essa descoberta com os outros.
sem falar que esse conhecimento se faz necessário não apenas para quem deseja ser fotógrafo. mais do que nunca estamos nos afogando em imagens – cada vez mais carregadas de referências ideológicas, de mensagens subliminares, de manipulações. aspectos que, juntos, tornam cada vez mais difícil saber se estamos vendo o que está diante de nós ou se estamos vendo o que outros querem que vejamos. parece-me cada vez mais imperativa a necessidade de refletir sobre imagens para quem quer ser fotógrafo, mas também para quem interage com fotografias. ou seja, todo mundo.
acho que o que pode atrapalhar esse processo é o descompasso entre o tempo que se pratica fotografia e o tempo que se encara a fotografia como área de conhecimento, a contante evolução tecnológica (novos modelos, novos recursos, todos os dias) e a fusão de suportes imagéticos, que exige novas formas de pensar imagem. resumindo: dá aquela sensação de que estaremos sempre correndo atrás.
enfim, tá na cara que é um processo lento, mas torço para que chegue logo o dia em que o aprendizado filosófico e/ou reflexivo sobre fotografia (sobre imagens, em geral) desperte tanto interesse quanto o mero aprendizado técnico.
Aahh, Chico, você sempre trazendo uma contribuição linda! Poderia falar sobre vários pontos do teu comentário, mas vou me ater ao finalzinho. Eu, particularmente, sou menos otimista. Acredito sim que estejamos vivendo uma fase onde, depois (bote tempo nisso), quando a poeira baixar e certas “coisas” sedimentarem, estaremos um pouco mais “maduros” e que o processo de produção afoito de imagens talvez passe a nos incomodar menos. Mas mais no sentido de adaptação a um mundo ditado por imagens. Pois não sei se consigo acreditar que este tempo de aprendizado de que você fala chegará e atingirá as pessoas de forma mais massiva. Ele já está aí, há muito tempo, mas atinge quem tem curiosidade, interesse, identificação… Olha nós todos aqui tentando descobrir e entender tanta coisa sobre fotografia. Gostaria muito de acreditar, mas creio mais que o descompasso faz parte da vida e acho que continuará assim, cabe a nós sabermos conviver com ele.
é pau, Maíra, o cenário não anima mesmo, né? tipo, sou meio desacreditado (acho que já manifestei isso em comentários anteriores). torço por uma reviravolta, mas já me preparei pra decepção, entende? eheheh
eu até vejo melhoria com a propagação desses ambientes acadêmicos, mas concordo contigo: isso é pouco. são ambientes criados no final do processo de formação do ser humano, quando a pessoa já é adolescente ou adulta. mudança mesmo veríamos se, por exemplo, fotografia virasse de vez disciplina de ensino fundamental ou fosse inclusa nas atividades de toda e qualquer educação artística dos pimpolhos.
já eu acho que essa poeira não baixa, não, acho que os ‘fotógrafos profissionais’ é que têm que tentar conviver melhor com a poeira. a fotografia tem um tempo muito diferente do nosso, ela tem se adaptado incrivelmente a todas as transformações culturais que temos vivido – nós é que não conseguimos acompanhá-la, vivendo dilemas que são meio ultrapassados. definir um fotógrafo amador de um profissional é uma limitação que não se justifica mais nesse momento em que cultura digital tá aí bagunçando as fronteiras entre autor, leitor, editor, produtor. Lessig disse uma coisa linda: vivemos uma diferente ecologia da criatividade hoje, falando da internet e de seus processos de mixagem. Com a fotografia é a mesma coisa – estamos suplantando paulatinamente esse embate entre produtor e receptor. todos passam a produzir fotografias porque as fotos entraram no nosso cotidiano como a escrita entrou no cotidiano da sociedade moderna ocidental. Todo mundo escreve, mas nem todo mundo escreve do mesmo jeito. é a mesma coisa com a fotografia: todo mundo fotografa, mas nem todo mundo fotografa do mesmo jeito.
Meninas,
Apesar de achar que todo mundo é o que imagina ser, contraditoriamente eu também penso assim:
sobrancelha designer, é designer? não.
peladeiro, é jogador de futebol? não.
blogueiro, é jornalista? não.
dono de qualquer negócio, é administrador? não.
então…. fotógrafo de fim de semana, flickr, festa ou instagram (meu caso), é fotógrafo? também não!
Colocando nesses termos, acho que fica bem claro mesmo.
Mas ainda há a problemática de como chamar os que clicam mas não são nem querem profissionais, ou estão aprendendo para tornar-se: fotógrafos casuais, amadores, clicadores, batedores de foto? Sei que é meio picuinha, mas isso fica martelando em minha cabeça!
Até porque já vi “fotógrafos casuais” fazerem fotos com nível de qualidade profissional, então penso que fica até estranho não considerá-los fotógrafos…
Você está se torturando demais Alexandre! Chama de fotógrafo mesmo, ué! Todo mundo quem dirige carro não é motorista? Duvido que os “motoristas profissionais” percam o sono por isso.
:**
Não sei se conhecem (ou se alguém já comentou), há um site com o seguinte nome “[Just because you own a camera] you are not a photographer” (http://youarenotaphotographer.com). É quase uma versão em blog da piada de PC Siqueira, dá pra se divertir. Mas falando sério: o fato da fotografia pertencer ao universo da cultura de massa não é algo a se desprezar. Passamos um século tentando afirmar a fotografia como expressão erudita, mas creio que sua presença forte no universo da arte contemporânea tem muito a ver com o fato de que todos tem uma câmera, de que todos fazem fotografia. Quando os artistas desejam desmontar a idéia de “gênio”, eles recorrem muitas vezes à fotografia, ao super 8, ao vídeo, ao xerox, ao silk, ao grafite… Todas as linguagens que estão no mundo. Priscilla lembrou Rouillé, quando diz que é preciso “ser herdeiro de uma cultura”… Tenho a impressão de que a produção dos amadores está desde sempre e definitivamente enraizada na cultura fotográfica, e essa é uma herança que muitos artistas atuais aprenderam a acolher (esse é o desdobramento da piada do PC, que percebeu bem que lá em NY o pessoal está usando “fotos toscas” em seus editoriais). Mas claro, é preciso separar as coisas: o amador e o artista popular fazem a fotografia que gostam e não precisam de muitas explicações pra isso. Eles têm seu lugar no mundo. O problema é quando algum deles quer assumir rápido demais o status de artista, de profissional. Você tem razão, Priscilla, aí a pose fica quase sempre desengonçada.
Gente, o debate tá lindo! Tou me deliciando a cada comentário! =)