7Aniversário – Para ela

Era ano novo, em uma praia que não me lembro.. Na memória, o sol morno do fim de tarde, a água quentinha do mar, minhas mãos engelhadas e o olho vermelho do sal.
Minha tia, jogava água nos meus cabelos e falava: piolha, vamos sair do mar, já já anoitece.
Eu, com um sorriso que não desgrudava do rosto dizia: mais um pouquinho tia!! Dava um mergulho para plantar bananeira, com os olhos abertos, porque eu gostava de ver o fundo do mar. E em cada mergulho pegava um pouquinho de areia e soltava, observando ela escorrendo pelas mãos.

Tia Hilde

Tia Hilde

Não me lembro quantos anos tinha, não me lembro de ter visto alguma fotografia desse dia, na verdade não tenho nem certeza se isso realmente aconteceu, ou se criei essa memória, para guardar um pouco da minha tia comigo… Mas não importa, isso está bem vivo em mim.

Tia Hilde foi uma das primeiras pessoas que vi fotografando. Ela tinha uma Canon AE1, que para mim era a maior câmera do mundo e a mais pesada do universo. Fecho os olhos e quase posso ver Tia Hilde tirando a máquina da bolsa de camurça marrom, em cima do sofá da sala da casa de Vovó Mina. E eu ficava olhando, de longe, curiosa, admirando aquele brinquedo enorme que ela tinha. Não, não sei se isso também aconteceu. Tenho pouca lembrança da minha tia. É estranho, que quando era mais nova, pensava nela e me vinham em mente mil histórinhas. Eu sempre dizia pra mim mesma: eu nunca vou esquecer isso. Mas esqueci, pouco a pouco, foi ficando mais longe, mais nebuloso… E hoje já não sei mais o que criei e o que vivi.

Quando comecei a fotografar, minha mãe me deu a AE1 da minha tia. Segurei, ficou pequena na mão e não pesou tanto. Nunca fiz sequer uma fotografia com ela. É como se, de alguma forma, não fizesse sentido para mim fotografar com a câmera da minha tia e não poder mostrar para ela.  Me sinto a piolha de alguns anos atrás, que só olhava de longe a máquina, curiosa, mas sem coragem de se aproximar.

Saudade de olhar com tia Hilde o livro com cheirinho de novo de Cláudia Andujar. Saudade de voltar de uma pauta e falar das fotografias que fiz. Saudade de ficar horas escolhendo a foto mais bonita, imprimir e dar de aniversário para ela. Saudade dessas memórias que ainda não inventei. Saudade de tudo isso que não pude viver.

De alguma forma, cada fotografia que faço, penso o quanto seria delicioso mostrar para ela.

Sobre Priscilla Buhr

Fotógrafa, Recife
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4 respostas para 7Aniversário – Para ela

  1. noemi ainda fazendo eco na tua cabeça! =)

  2. Mateus Sá disse:

    que lindo amiga! Estou realmente encantado com essa série de textos que vocês estão postando sobre a memória. Suavidade e alegria na leitura!

  3. joana disse:

    lindo texto! Pri, vc anda cada vez melhor!

  4. Iara Meireles Carneiro da Cunha disse:

    Pri gosto muito do seu estilo ! Me faz bem viajar na leveza das linhas escritas por você !

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