No mês em que se comemora o Pin Hole Day, vale conversar um pouquinho sobre alguns movimentos que temos visto circulando por aí e que resgatam a boa e velha fotografia analógica, para alguns uma novidade, para outros um saudosismo e para muitos uma eterna paixão.
O PinHole Day é um evento mundial que acontece no último domingo de abril (esse ano será no dia 29) para celebrar o dia mundial da fotografia Pinhole, a ideia é juntar as pessoas para produzir suas próprias câmeras ( seja de lata, caixinha ou o que der na telha) e sair por aí para fotografar. No Brasil várias cidades irão participar da atividade, dá para procurar no site e ver se tem algum evento perto de você!
Aqui em Recife, por exemplo, a fotografia analógica tem adeptos cheios de amor pela técnica, recentemente Damião Santana, designer e entusiasta da fotografia (como ele mesmo se denomina), ofereceu uma oficina de Fotografia Experimental | Analógica e também irá promover o PinHole Day em Recife. Sem falar em Isaías Belo, fotógrafo e arte-educador, que ministra oficinas de Pinhole desde 2003 e tem trabalhos documentais todos desenvolvidos com a técnica ou Mateus Sá que na sua última exposição, “Antes de ontem, ontem e hoje”, no Centro Cultural dos Correios, resgatou uma parte de seu acervo analógico, resignificando-o em uma obra que se apresenta com diversas roupagens, desde o documental tradicional a inserções numa estética mais contemporânea.
É interessante observar que estes movimentos tem sido felizes em aproximar o público jovem dessa prática. As novas gerações (me incluo aqui) estão descobrindo a magia da fotografia analógica, suas práticas manuais, seu tempo diferenciado, o prazer de ver a imagem ir se construindo aos poucos… São encantos que para uma geração que aprendeu a fotografar direto com o digital surgem apenas agora.
Câmeras lomo, pinholes, pinluxes, plec-plecs, grandes e médios formatos, polaroids, processos de revelação com reveladores caseiros, experimentações com filmes vencidos, a descoberta de técnicas como a solarização, daguerreótipos, ambrótipos, ferrótipos, cianótipos… Práticas antigas, e até seculares, mas que para as novas gerações chegam como novidades, descobertas que abrem inúmeras possibilidades criativas.
E não dá para falar de fotografia analógica, experimental e pinhole sem citar Miguel Chikaoka e Dirceu Maués dois grandes fotógrafos representantes da fotografia paraense, e brasileira. Chikaoka dispensa apresentações, fundador da FotoAtiva e da agência Kamara Kó, exerceu forte influência sobre toda uma geração de fotógrafos paraenses e destaca-se também como produtor e educador que, em seu trabalho, se foca no estudo da natureza da luz, na utilização dos sentidos e da percepção por meio da construção e utilização de câmeras artesanais, estimulando o uso da fotografia como prática transformadora.
Maués é fotógrafo desde 1991, foi repórter fotográfico nos grandes jornais impressos de Belém. Possui trabalhos nas Coleções Pirelli-Masp, Fnac, VideoBrasil, MAC-PR, MARP (Ribeirão Preto), MEP – Museu de Arte do Pará e Coleção Joaquim Paiva. Desde 2003 utiliza a técnica da fotografia pinhole como linguagem estética no seu trabalho autoral, inclusive ampliando suas experiências nessa técnica para o cinema e vídeo, buscando fundir e subverter os paradigmas dessas linguagens. Como o vídeo “…feito poeira ao vento…”, realizado a partir da animação de uma seqüência de 991 fotografias captadas em uma única ação (de 04 horas de duração) com câmeras artesanais pinhole.
Ambos oferecem oficinas Brasil a fora, levando suas paixões e experiências, despertando no público o encanto da prática analógica e artesanal. Eu mesma fui mordida por esse bichinho em uma oficina de Chikaoka em 2009, na Galeria Arte Plural. “De olhos vendados” foi uma experiência incrível, que abriu meus olhos e coração. A oficina se propunha a gerar uma reflexão sobre o universo material e simbólico da luz através de jogos, exercícios sensoriais, e a construção de dispositivos que operam com as propriedades da luz (pinhole). Chikaoka pouco ou nada fala durante toda a oficina, mas tudo nele é tão absurdamente eloquente que ficou ecoando em mim durante muito tempo. Só ali percebi como a fotografia pode ser misteriosa, sedutora e caprichosa, me dei conta de seu poder enquanto elemento de comunicação, educação, cultura, como escolha de vida. Ali entendi elementos básicos da fotografia que nunca antes, e poucas vezes depois, muito por ter tido essa primeira experiência, é que fui entender.
A própria lomografia é também uma grande difusora da fotografia analógica entre jovens e adolescentes, muitos descobrindo a película pela primeira vez. Claro que o mercado ainda sofre muito, principalmente para aqueles que viveram épocas de ouro na fotografia analógica. Ver a Kodak sucumbir foi aterrador, ou, para os pernambucanos, ver seu Alcir Lacerda fechar as portas. Inevitavelmente, o número de interessados é menor hoje em dia, mesmo que haja uma demanda crescente.
Mas o comércio também se recria e renova, não cede. A Fuji, por exemplo, continua atuando, se renovou, se readaptou. Outras pequenas empresas continuam a produzir, em escala menor, mas a todo vapor, como a tcheca Foma, a británica Kentmere, e a alemã Rollei (ler a reportagem do Jornal Espanhol El País – ¿Sobrevivirá la fotografía analógica?).
Então, se estávamos muito preocupados em não deixar a fotografia analógica morrer, é bacana ver que essa é uma resposta a qual muitos não previam. Muitos fotógrafos, acostumados com a rapidez e praticidade da fotografia digital, têm encontrado na fotografia analógica a magia do tempo, da espera, da química e da física, do fazer artesanal, da câmera escura. Tem ocorrido um movimento bem interessante de retorno a essas práticas e tecnologias, gente querendo colocar a mão na massa, entender e acompanhar algumas etapas do processo de perto, bem perto.