Podia ficar olhando pra sempre esse quadro de Mark Rothko

Mark Rothk. Vermelho vivo sobre Castanho. 1959

Não sei se alguém já ouviu a frase: uma fotografia para encher os olhos e tão pouco posso imaginar se ela provoca nos outros o tanto de reflexão que causa em mim. Fico me perguntando: encher os olhos para que? Com o que? Qual a necessidade de se ter olhos cheios?

Falar sobre a sociedade saturada de imagens já virou um lugar comum, mas refletir sobre as imagens que escolhemos guardar, me parece cada vez mais necessário.

Há bem pouco tempo assisti o espetáculo Vermelho, sobre o pintor russo, naturalizado americano, Mark Rothko. Rothko foi um pintor expressionista abstrato que participou de um movimento de renovação da pintura nos anos 50, do século passado, em Nova Iorque, e entrou em crise ao ser convidado para pintar murais para um famoso restaurante americano. A peça, estrelada por Antonio e Bruno Fagundes, e com direção de Jorge Takla, tem uma direção de arte cuidadosa e está repleta de cópias das telas do pintor em cena. O espetáculo tem um texto impecável e cheio de referências e entre seus temas estão o questionamento da arte como comércio, questionamento que já era forte há 60 anos e hoje se faz extremamente necessário, mas essa já é um outra conversa…

Primeiramente, o que me chamou a atenção foram os diálogos entre o pintor e seu assistente e como Rothko apontava para a importância de se ter conhecimentos outros, além de seu próprio metiê. Só a riqueza do texto, que destaca, entre tantas coisas, a necessidade de que outras artes nos alimentem, já havia nutrido o bastante minha criatividade, até o momento em que fui atravessada por um quadro.

Era uma tela de um vermelho intenso, que mudava de acordo com a iluminação do espetáculo, criando uma infinidade de leituras a partir das cores que iam sendo geradas. Fiquei olhando pra sempre o quadro, tentando absorver seus sentidos, tentando descobrir até onde a minha imaginação conseguia chegar. Eu queria esgotar todas as possibilidades de leitura que aquela imagem me trazia. Queria descobrir o sentido daquela cor, vermelha, pura, abstrata. Perceber as questões formais, sentir o que fazia sentido pra mim.

Era quase como se meu olho pudesse respirar. Era um olhar em fluxo, que se enchia e se esvaziava o tempo inteiro. Dinâmico, vivo, oposto aos olhos cheios e estáticos, sem espaço para o vazio, para o movimento.

Em alguns momentos, é necessário não olhar fotografia nenhuma, em outros é preciso olhar o vazio, ou o nada, como já fez Priscilla, mas alimentar o olhar e deixa-lo fluir, é exercício diário e constante.

Por isso eu podia respirar pra sempre esse quadro de Mark Rothko.

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