Me peguei pensando ultimamente em como temos (nós fotógrafos e a sociedade como um todo) sido enfáticos na análise e estudo da mulher como “objeto” fotográfico: o corpo, as inquietudes, a força, o desejo. O feminino está cada vez mais vivo na fotografia contemporânea. Talvez a grande problemática em torno do machismo e o boom dos movimentos feministas que vêm lutando pela quebra de preconceitos de alguma forma tem mexido bastante (desde sempre na verdade, mas atualmente de forma mais intensa) com o pensamento fotográfico, tamanha a quantidade de projetos que buscam desmitificar o corpo da mulher e tudo que está por trás do nu real feminino.
Todo esse movimento me fez parar para pensar no homem. Como o homem se vê nessa configuração atual da sociedade? Como o homem se mostra? Como a fotografia tem mostrado o masculino? Na verdade a minha maior dúvida é: onde está o homem e toda sua complexidade na fotografia?
Isso vem me inquietando há algum tempo e por acaso me deparei com essa fotografia de Mario Cravo Neto e várias respostas surgiram assim como um monte de novas questões!

Mario Cravo Neto
E parei. Fiquei olhando para sempre esse homem e o seu coração de pedra e toda a simbologia da entrega sem o olhar. É quase como uma fuga de si mesmo. O movimento daquele corpo é quase uma repulsa ao próprio coração. O homem se mostra ali de uma forma tão fria e ao mesmo tempo tão amedrontada que o meu corpo reage de forma contrária aquela “entrega”. Eu não receberia o seu coração. E como é possível ser tão intenso e tão duro simuntaneamente? Será esse paradoxo o norteador do comportamento masculino? Como o homem se vê com o coração na mão?
Às vezes penso que existe tanta cobrança social por um comportamento sóbrio e controlado do homem que a reação tem sido cada vez mais oposta ao que se impõe. Porém, são reações veladas, quase proibidas de serem expostas. Ser gente é difícil. Sentir não é fácil. E como é sentir o nó na garganta quando se diz que homem não chora? Parece um pensamento arcaico, mas está bastante vivo e pulsando em tantos corações de pedra por aí.
O trabalho de Mario Cravo Neto me despertou esses questionamentos. Comecei a fazer uma leitura bem diferente de seus “homens”. Alí, eles estão inteiros, expostos, nús de corpo e alma. Vivendo e sentindo de forma crua. Com a dor, a força, inquietude e toda verdade e medo presentes no íntimo do homem, do ser humano homem. Porque “a vida é foda”, como bem disse o próprio Mário Cravo Neto, e não dá para se esconder disso.
E como é bonito perceber a quebra de tantas amarras. Como é bonito olhar em olhos não mascarados. Como é bonito sentir o homem tão orgânico, vívido. Afinal, ser inteiro é ser humano.
Obrigada Mario Cravo Neto por me fazer enxergar o masculino com olhos tão mais abertos e tão mais cheios de tesão.
Exercendo o direito de ser sintético: Ducarai!
É intetessante Priscilla a abordagem poética e simbólica que Mario Cravo Neto utilizou no trabalho que fez com o candomblé.Essa imagem , por exemplo. tràs na pedra a representação do orixà. São os “Otàs” ,que são os objetos usados nos assentamentos dos orixàs.Eles variam ente pedras e metais e a partir da consagração esses os otàs passam a representar o orixà do iniciando. Grande artista MCN, aliàs, acho que ele abordou a religião africana como Andujar abordou os yanomamis,
com a força do imaginàrio. Por isso são grandes artistas…
MCN é um dos maiores!! Grande artista, grande referência! É muito bonita a forma como ele representa e simboliza os elementos do condomblé, sempre muito delicado e muito intenso.. de uma força sem tamanho. E sempre me faz ver um pouco além das formas e simbolos concretos.. é muito difícil eu fazer apenas uma leitura de suas imagens. Como essa por exemplo. Sempre fui louca por essa fotografia e sempre a li de uma forma.. esses dias essa ideia despertou.. e fiquei com a cabeça borbulhando.. e poucos fotógrafos me deixam tão em ebulição como MCN!! Obrigada pelo comentário, apareça sempre por aqui!! 🙂
“Ser gente é difícil. Sentir não é fácil. E como é sentir o nó na garganta quando se diz que homem não chora? Parece um pensamento arcaico, mas está bastante vivo e pulsando em tantos corações de pedra por aí.”
Sem mais.