Quero morar numa cidade onde se sonha com chuva. Num mundo onde chover é a maior felicidade. E onde todos chovemos.
Mia Couto
Eu gostaria de começar 2013 falando de amor e também de afeto, de felicidade, de alegria, de delicadeza, de carinho e de sonho.
A frase “mais amor, por favor”, está estampada nas paisagens urbanas, grafitada nos muros e disseminada nas redes sociais. No entanto, observo que muitas pessoas que propagam essa atitude, não conseguem agir de forma amorosa, nem com o outro e nem consigo mesmo. Outra coisa que me intriga é ver tanta gente, jovens em especial, demasiadamente preocupados com uma estabilidade financeira e a construção de um padrão de vida burguês.
E antes que me julguem, eu não estou pregando a imposição de uma vida franciscana, mas me impressiona o quanto nossa sociedade trocou os sonhos, a vontade de mudar o mundo, a utopia e a felicidade por um projeto de vida baseado no consumo.
Não entrarei aqui nos conceitos filosóficos sobre felicidade, mas indico a leitura do texto da jornalista Eliane Brum sobre o direito de sermos infelizes.
Há pouco tempo, li um livro chamado A educação (do) sensível, do professor da Unicamp, João-Francisco Duarte Jr.. Em seu texto, Duarte Jr. nos fala da crise sem precedentes que vivemos no mundo hoje, traça um panorama histórico sobre o que nos trouxe até este momento e aponta questões do dia a dia para elucidar alguns dos paradigmas contemporâneos, entre eles a perda da nossa sensibilidade. João-Francisco aponta a educação dos sentidos como um possível caminho. Educar nosso olhar, mas também nosso tato, olfato, audição e paladar.
Mas o que tudo isso tem a ver com fotografia?
As vésperas de iniciar oficialmente minha pesquisa sobre o ensino e a aprendizagem da fotografia, acredito, cada vez mais, na força da fotografia como experiência de vida e formação.
Não é raro ouvir dos fotógrafos o quanto suas vidas mudaram radicalmente depois que a fotografia entrou nas suas vidas e só pra citar alguns, podemos falar de Miguel Chikaoka, Sebastião Salgado e Pierre Verger, que tiveram seus caminhos alterados depois do contato com a mesma.
Acredito que a fotografia pode integrar nossas essências, alimentar a vontade de potência de cada um e se tornar um caminho para o que nos é vital. E isso não necessariamente tem a ver com a profissão de fotógrafo.
E não é muito difícil afirmar que a fotografia é uma experiência singular, experiência que ocorre por causa de nossa interação com as condições externas que estão envolvidas no próprio processo de viver. E sobre experiências, é o filósofo John Dewey que nos diz que quando significativa, uma experiência emocional, torna-se qualidade de uma experiência complexa que se movimenta e se altera.
E esse movimento, ou seja, essa multiplicidade de experiências que a fotografia pode proporcionar, vai além do puro treinamento técnico, ele se aproxima de um permanente movimento de procura, da questão da inconclusão do ser humano.
Tomando de empréstimo o pensamento de Marie-Christine Josso, sobre a formação como uma procura de uma arte de viver em ligação e partilha, é possível afirmar que a fotografia pode traduzir-se numa busca em que cada pessoa, à sua maneira, participa de uma questão essencial que gira em torno da possibilidade de encontrar o “seu devido” lugar numa comunidade, de definir orientações de vida que satisfaçam um sentimento de integridade e de autenticidade e de colocar em evidência a formação dos sentimentos que dão um colorido ao “conforto de viver”.
E nossa vida anda precisando desse colorido, não um colorido artificial, fingido, que esconde as cores escuras em prol de uma falsa felicidade. Diante da necessidade premente de #maisamorporfavor, o contato com a fotografia pode se desdobrar num devir humano, que orienta a formação e o desenvolvimento da felicidade.
A fotografia surge então como uma procura da arte de viver em formação, em ligação, partilha, criatividade e experiência estética.
Por falar em amor, há um livro recente e bastante interessante do filósofo francês LUC FERRY sobre o tema. A revolução do amor. Para ele, com o fim das utopias revolucionárias e metafísicas apenas o amor em sua forma mais sublime,ou seja, Ágape, pode ser a solução para a crise atual das sociedade pós-industriais. Em tempo. Sou também amante da fotografia.
Olá Val,
Antes de mais nada quero parabenizá-las pelo ótimo blog. Gostei tanto dos textos que depois de ir “rolando” as páginas no browser, para conhecer um pouco mais do trabalho de vocês, já tenho uma coleção dos posts anteriores de vocês aqui no laptop (dá um livro!). Quero ler com calma, degustando…
Reflexão interessante essa sua, e sobre a frase que fecha o artigo eu diria que a fotografia é apenas uma das poderosas ferramentas nesta “procura da arte de viver”, assim como o é a música entre tantas outras artes, e para mim essa é a razão de ser da fotografia que pratico e amo.
Abraços,
Ari