7Aniversário: Podia ficar olhando pra sempre esta foto de Evgen Bavcar

Em 7 de fevereiro, o 7 completou 2 anos. Resolvemos comemorar nosso aniversário com algumas colaborações. A primeira é com Lívia Aquino. No ano passado, a editora do blog Dobras Visuais nos convidou para fazer um “Desempacotando minha biblioteca“. O convite foi um desafio. Escrevemos em um processo de muita troca, um texto à doze mãos, em primeira pessoa, sobre como nos toca o artigo “Sentiu uma fotografia desviar seu caminho?“, da Cláudia Linhares Sanz. O nosso texto foi publicado no Dobras esta semana, inaugurando a volta das férias de Lívia, e, a partir dele, escreveremos uma série de “Olhando Pra Sempre” com as fotos que enviamos para ilustrar o post por lá. Cada uma daquelas fotos, tem um significado especial para cada uma de nós. E, aqui, no nosso blog, a gente vai partilhar um pouco desses significados. Abaixo, eu inicio esse processo. E as outras colaborações de aniversário serão reveladas logo mais, em um #7Fotos especial que viemos construindo com pessoas queridas. Aguardem!

“Porque essas imagens me fazem me sentir existindo, unicamente, especialmente, como se isso, esse sentimento, esse sublime não pudesse se repetir nunca. E é daí que percebo a força transformadora que a fotografia tem na minha vida. De alguma forma ela sempre vem nos momentos cruciais e desestabiliza, mexe, tira tudo do lugar, me tira do meu espaço e me faz repensar meus conceitos. E, quase sempre, me faz perceber o que de fato é importante” (trecho do nosso “Desempacotando…” lá no Dobras).

Image

Evgen Bavcar | L’àngel (1995)

Lembro-me como se fosse ontem do dia em que assisti ao documentário “Janela da Alma”, de João Jardim e Walter Carvalho, pela primeira vez, em uma aula nos primeiros períodos da minha graduação em jornalismo. Vários depoimentos e imagens contidos no filme mudaram a minha vida e até hoje passo o filme para meus alunos verem.

Porém, ali no meio de tantas histórias incríveis, uma imagem desfocada, que vai aos poucos sendo revelada no filme, mexe diretamente na minha alma. Era uma fotografia de Veronica, sobrinha do fotógrafo Evgen Bavcar. Na imagem, a menina corre e dança (nas palavras do próprio Bavcar) em um descampado.

Veronica sou eu. Aquela menina livre, de roupa solta, em meio à natureza, flutuando com o vento que bate no corpo, cantando ao mesmo vento, sou eu. Enquadrada no canto esquerdo da foto, nunca no centro, sou eu. Em um plano levemente inclinado, misterioso, cheio de texturas a serem sentidas e descobertas pelos pés (suponho) descalços, mas sempre no chão. Sou eu. Posso sentir o dia de domingo. Posso sentir o cheiro bom do mato. Posso ouvir as músicas que cantarolo e para as quais, ao mesmo tempo, bailo. Em um baile à liberdade, à leveza, à felicidade. A dança daquela menina é a dança que dancei um dia e que, vez ou outra, me permito (re)experimentar e decidir, mais uma vez, que é preciso voltar a ensaiá-la mais vezes. Como é bom! Como é leve! Como é gostoso! Passaria horas ali, viajando na minha dança de menina, sem vergonhas, sem inseguranças, sem desconfianças, apenas sendo, como sou, através da foto de Bavcar.

O fotógrafo é cego. Ele não via a sobrinha. A foto, na verdade, não tem Veronica como referente. Nem (muito menos) eu. A garota leva um sininho, que, este sim, para Bavcar, era a referência sensível. Ele não a via, ele ouvia o sininho. E foi o sininho que foi fotografado. Esta é uma foto do som que ecoava sobre aquele campo. Bavcar define, então, esta foto como uma “fotografia do invisível”.

E agora? Continua Veronica sendo eu? Continuo correndo descalça na grama? E eis que me dou conta de que a fotografia sempre é invisível. Essa fotografia que eu sinto, que eu vivo, que eu experimento, que me traz ao que eu sou, que me emociona, ela está em mim, ela é invisível, sempre, como todas as fotografias que nos movem e sobre as quais falamos no texto publicado no Dobras. A fotografia que desvia nosso caminho é aquela fotografia do invisível, pois, já dizia Saint-Exupéry, o essencial é invisível aos olhos. Ele está na alma. Os olhos são apenas as janelas, aquelas que conectam a alma às imagens. E que imagem! Olharia pra sempre e sempre olho esta foto de Veronica/Eu/Sininho, quando preciso me conectar à minha alma. Ela, para mim, é como um autorretrato, daqueles que sai de dentro, do fundo, pra fora. Mas, nesse caso, foi meu autorretrato que entrou em mim.

E pensar que eu ainda preciso das janelas dos olhos, enquanto o fotógrafo, sem a visão, se conecta de modo tão intenso com a alma, a ponto de conseguir criar imagens, mesmo sem vê-las, e nos emocionar com elas, através de nós mesmos… Serei eternamente grata.

Sobre bellavalle

Fotógrafa, pesquisadora, professora da UFPB, mestre pela PUC/SP, doutoranda pela UFPE e amante da vida.
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