Algumas fotografias parecem nos escolher. E nos causam tanto impacto que é como se nos falassem dos caminhos que vamos percorrer pela vida. Lembro de quando Joana Pires me mostrou o livro de Otto Stupakoff e do impacto que essas fotografias causaram em mim, especialmente essa, do menino de costas para câmera e olhando para parede.
De alguma maneira, que não sei bem explicar, esta série me mobiliza e me consola. Talvez pela aparente solidão do pequeno, ou quem sabe se pela relação dele com as garatujas na parede, ou ainda pelo adulto, que na minha fantasia, colocou a criança lá.
É como se essa imagem me falasse da relação que os adultos costumam estabelecer com as crianças, como se a infância fosse uma preparação para a vida “de verdade”. Conviver com crianças num processo educativo tem sido para mim uma experiência bastante singular. Acredito que essa foto acabou antecipando um tanto dessa minha vivência e me falou do imaginário pulsante e do olhar particular que os pequenos tem para o mundo e que dão mais significado ao dia a dia.
Numa primeira leitura, essa fotografia pode até sugerir um castigo, mas as brincadeiras com a geometria, a relação do menino com o espaço, seu olhar direto para câmera e as relações que se estabelecem me dizem do incômodo que as crianças também causam, do trabalho que dão e das possibilidades de crescimento que tudo isso oferece.
Não consigo olhar para a imagem e não lembrar do médico e pedagogo polonês Janusz Korczak, que optou ir para o campo de concentração com as crianças do abrigo em que ele trabalhava, para que elas não sofressem sozinhas os horrores da guerra. Há um livro de Korczak que para mim faz uma conversa com essa imagem. Em Quando eu voltar a ser criança, um homem volta a ser criança, mas permanece com sua mente de adulto.
Acho que este é um bom exercício para nós!
Em tempo: a série de fotos do Otto Stupakoff estão no livro Sequências, do Instituto Moreira Salles.