Em fevereiro deste ano, eu fui convidada pelo fotógrafo Eduardo Queiroga para produzir o projeto Imagem.Experiência, que havia sido aprovado pela última edição do Funcultura, em Pernambuco. A idéia é realizar quatro oficinas de fotografia, uma em cada macrorregião do estado (Região Metropolitana, Zona da Mata, Agreste e Sertão), para professores da Rede Pública de Ensino, e trabalhar a imagem como ferramenta pedagógica de estímulo à reflexão e à construção de conhecimento em sala de aula.
Nesses dois meses de envolvimento com as atividades de produção das oficinas, muita coisa mexeu com as minhas reflexões acerca do papel da formação no campo da fotografia. Um dos principais desafios que eu tive foi conseguir espaço para dialogar sobre o projeto no âmbito das instituições governamentais que gerenciam a educação. A fotografia, como espaço de mediação do pensamento crítico e fonte informacional, é ainda vista como elemento menor por vários gestores e assessores que administram a burocracia educacional no Brasil.
Este desafio, porém, ficou pequeno frente à maneira como ela é vista no cotidiano escolar. A fotografia ou é tida como a ilustração que encontramos nos livros de escola ou como um instrumento a ser usado nas aulas de Artes. Em ambos os casos, a perspectiva não é animadora. A imagem vista apenas como ilustração é uma maneira de validar o texto como fonte principal de informação. A fotografia como peça das aulas de Artes vive o descaso com que o ensino dela no Brasil é encarado, ou seja, como um passatempo para os estudantes não pirarem dentro da escola.
Antes de continuar, um parêntese: vale a pena ler a edição da revista Trip que fala sobre Educação, em especial, a linda entrevista de Dona Vilani, mãe do rapper Criolo. Dica dada, continemos. A minha irmã é professora do ensino público e tem me ajudado muito na compreensão do contexto escolar e nas formas de atuação para conseguir encaminhar o projeto. Uma das coisas mais fortes que ela me disse foi: “não conte com professores de física, química, matemática, biologia e afins nas aulas. Parte deles acredita que as coisas relativas às artes devem ficar longe das aulas de exatas e especialidades biológicas”. Eu só conseguia pensar: para onde estamos levando o ensino do Brasil?
Em seguida, comecei a achar essa perspectiva muito estranha porque em algumas escolas particulares do país (muito poucas, é verdade) o debate sobre imagem aos poucos tem sido inserido. Além disso, o Governo Federal, por meio do programa Mais Educação, tem realizado oficinas de fotografia na Rede Pública de Ensino. A carga horária é pequena: apenas três horas de aula, uma vez por semana. Porém, diante do contexto do ensino no Brasil, esse contato semanal até pode ser muito útil dependendo de quem esteja conduzindo o processo educativo.
Eis que chegamos ao problema: quem está formando estes estudantes e como está formando?
Pensemos: apenas em Pernambuco há cerca de 1.112 escolas estaduais espalhadas pelo estado (imaginem o resto do país!!!). Se metade delas aderirem ao programa Mais Educação, por exemplo, e resolverem inserir oficinas de fotografia no cotidiano da escola, quem vai dar aulas? (Pergunto isso, inclusive, considerando uma discussão séria sobre a remuneração simbólica que é oferecida em projetos desta natureza – como se o educador de fotografia não precisasse investir na própria formação). Além disso, podemos ter escolas municipais e particulares interessadas pelo assunto.
Diante deste contexto, eu observo que existem pelo menos dois caminhos que precisamos discutir:
a) a formação dos professores que conduzem as especialidades tradicionais no ambiente escolar;
b) a formação de educadores específicos para fotografia.
Em relação à formação de professores que não atuam especificamente no campo da imagem há muito a fazer – eu diria praticamente tudo. As experiências que eu tenho acompanhado trabalham a relação da fotografia com a escola por meio de projetos de extensão, oficinas ou palestras, mas a maioria delas voltada para estudantes. Os professores, em geral, quase nunca são pautados pelos projetos. Lembro que quando estava peregrinando em busca de um local para fazer o Imagem.Experiência, diversos diretores se assustaram com o público alvo do curso.
Por ter o sistema educacional no Brasil, hoje, o pensamento de que a violência se diminui mantendo estudantes o dia inteiro na escola, em turmas cada vez maiores, quase não sobra tempo para os professores investirem em formação diferenciada ou experimentar outras maneiras de construção de informação. Eles podem vivenciar algo diferente quando saem em “passeios” pelas escolas ou participam de programas organizados pelos departamentos educativos de museus, galerias, institutos culturais e instituições de preservação. Porém, a duração deles é muito curta e compreensivelmente focada no trabalho que está exposto no momento.
Assim, se os processos formativos não chegam junto do horário de trabalho dos educadores ou próximo das capacitações que eles precisam participar, a possibilidade de adesão é bem pequena. Então, estamos dispostos a investir nessa aproximação?
Em relação à educação específica para fotografia, existem projetos como o Imagens do Povo, no Rio de Janeiro, que possuem cursos para educadores como parte do Programa de Formação Continuada. Ou seja, depois que a turma termina as aulas na Escola de Fotógrafos Populares, quem deseja trabalhar também (ou apenas) como educador pode ingressar na formação específica (os dois cursos devem durar em torno de um ano e meio). A Associação FotoAtiva também tem projetos voltados para esta área, em Belém, por meio do Grupo de Estudos Pedagogia da Luz.

Turma no Rio de Janeiro participa do primeiro curso do Grupo de Estudos Pedagoria da Luz fora de Belém | Foto: FotoAtiva

Aula inaugural do curso de formação de Educadores do Imagens do Povo | Foto: Agência Imagens do Povo
Porém, além destes projetos, que vêm de programas de educação popular e são realizados por iniciativas independentes ou organizações culturais, como os demais cursos de fotografia estão preparando para lidar com isso? Temos poucos bacharelados no país, nós sabemos, mas há diversos cursos em instituições particulares, escolas de arte, projetos de extensão e afins. Como eles se posicionam? Será que podemos considerar que, além do fortalecimento dos cursos destas instituições culturais independentes e dos bacharelados, precisamos pensar em algo como uma “licenciatura” para a área de fotografia?
Este é um tema interessante porque os cursos, em geral, são vistos como espaços para trabalhar técnica fotográfica, princípios da fotografia ou a especialização em áreas do mercado (como retratos, gastronomia, arquitetura, casamentos, entre outros). A possibilidade de termos programas especiais, para quem quer trabalhar investindo na formação de outras pessoas, pode ser bastante significativo neste momento em que estamos sendo convidados, mais enfaticamente, a pensar na fotografia enquanto linguagem e meio de construção de discurso.
Isso é importante, também, porque herdamos, desse contexto de vinculação da fotografia com a técnica, a perspectiva de que ela pode apenas ser ensinada por fotógrafos. Se trabalhamos com o ponto de vista do uso da imagem como linguagem, ferramenta de elaboração de discurso e meio de construção de conhecimento, admitimos que pessoas de outras áreas – sejam professores licenciados, pesquisadores do campo da imagem ou educadores populares – podem se especializar no ensino da fotografia e atuar, em seus respectivos contextos, como formadores de outras pessoas. Esta é uma perspectiva que muito me anima e que gostaria de ver mais discutida entre todos nós.
coloca a ferramente a do facebook para compartilhar lnks do seu wordpress !!!
Oi, Adriano, para fazer isso, você só precisa clicar no botão curtir que aparece embaixo do texto. Ao curtir, o facebook já publica a postagem no seu perfil. Você também curtir a página do 7 no facebook (box aí do lado) e compartilhar as postagens por lá. 🙂
Pingback: Fotografia Participativa na Escola | RETRATOGRAFIA