Diário de Bordo – I Encontro Pensamento e Reflexão – Pensar para evitar a anestesia

Como eu havia dito no post anterior, o I Encontro Pensamento e Reflexão na Fotografia trouxe muita coisa para pensar. O workshop de Juan Antonio Molina mexeu bastante com várias ideias que tínhamos sobre edição, curadoria, representação e construção de um discurso relacionado ao contexto fotográfico que por ventura somos convidados a interagir ou no qual nos vemos envolvidos por motivos diversos.

Para mim, especificamente, as suas reflexões foram tão intensas que eu decidi me debruçar sobre o que ele disse com mais tranquilidade e fazer o meu próximo diálogo sobre este tema. Deste modo, não vou esmiuçar agora as questões trazidas durante o restante do workshop, mas prometo fazê-las em meu próximo diálogo, quando terei finalizado, inclusive, as tarefas que ele nos encaminhou nos últimos momentos do curso.

Juan Antonio Molina | Foto: Marcela Jones

Uma coisa vale a pena dizer, porém: uma das características que mais admirei nele foi a capacidade de rever as próprias ideias. Quando chegamos para a segunda aula, ele nos disse que, durante os diálogos conosco, teve algumas percepções que colocaram em dúvida algumas crenças que carregava consigo. Porém, como o insight havia ocorrido naqueles instantes e ele não havia tido tempo de investigar melhor essas novas ideias, ele não iria apresenta-las como algo mais concluso.

Então, dividiu conosco os primeiros passos das questões que estavam aparecendo. Ele pensou sobre o sentido da palavra “texto” para a proposta de discurso produzida acerca de um trabalho que será editado para uma revista ou exposição. Será que a narrativa que emerge do trabalho de interação do editor ou curador com a fotografia em questão poderia ser chamado mesmo de texto? Será que a associação com a linguagem textual seria a forma mais adequada?

Molina colocou que, embora a linguagem escrita ainda guie muito o contexto de produção do discurso associado à imagem, ele ficou pensando que esta produção de discurso estaria mais próxima de uma alegoria desta linguagem do que da dinâmica do texto em si. Ficamos todos pensando em conjunto. Ele anotou esses fragmentos para estudar melhor quando voltasse para o México. Vamos ficar pensando por aqui, também (convido vocês a refletirem conosco)! Bem simbólico!

O mais interessante é que estávamos conversando Ana Carolina e eu, mais cedo, justamente sobre esse assunto de não nos deixarmos ser invadidos pelo monstro da indiferença, como diria Otto Lara Resende. Essa invasão provoca a síndrome do piloto automático, aquela que anestesia a nossa capacidade de questionar, rever e nos colocar diante de outros rumos e aprendizados. Refletir sobre isso me fez perceber que talvez pensemos a fotografia para não sucumbirmos à tentação de permanecer na zona de conforto que acomoda o olhar. Interno e externo – além dos fluxos entre eles.

Pensei mais um pouco sobre isso quando acompanhei a segunda tarde das convocatórias de artigos e pesquisas, que trouxe os projetos Do Pictorial ao Moderno Sem Fronteiras, de Lucas Mendes Menezes; Antonio Quintana y La Produtividad Política de La Mirada, de Loreto Andrea Solis; e La Fotografía Irônica Durante La Dictadura Militar Argentina, de Cora Gamarnik. É muito significativo ter acesso às discussões que esses pesquisadores produzem. Eles agregam informações que podem mudar completamente a nossa forma de perceber questões que estão tão próximas de nós.

Cora Gomanik e Loreto Andrea Solis | Foto: Marcela Jones

Recordo que minhas percepções sobre as ditaduras na América Latina foram tomando outros contornos quando alguns amigos dedicaram seus projetos de mestrado ao tema. Por meio de pesquisas em acervos fotográficos, projetos artísticos e diversos outras fontes, eles descortinaram um panorama de contextos que eu jamais havia imaginado. Da mesma maneira, o trabalho de Cora Gamarik me deixou com vontade de conhecer melhor o conteúdo das discussões que ela apontou no evento.

Seria ótimo se os vídeos dessas apresentações ficassem disponíveis para consulta on line e os textos em PDF também. Acho que muita gente que passou pelo evento, ou não teve a oportunidade de participar, deseja o mesmo. Vamos torcer que tanto esse conteúdo possa ser acessado na rede, quanto para que as convocatórias ativem mais espaços nas próximas edições do Encontro Pensamento e Reflexão.

Essa ponte entre os projetos e um público mais amplo é uma iniciativa bem importante, não apenas por ajudar a divulgar novos pesquisadores, mas principalmente porque podemos entrar em contato com uma produção de conhecimento que é significativa nos campos teóricos e práticos da fotografia. O grande desafio, contudo, é diluir a ideia de que os trabalhos acadêmicos pouco falam sobre o nosso cotidiano e que não é interessante conhecer essa produção.

Eduardo Monteiro (Coletivo Fotonauta) apresentando pesquisa que criou elos entre os trabalhos de Lygia Clarck e Marcel Gautherot | Foto: Julio Riccó

É um trabalho de formiguinha que precisa ser feito para criar elos e despertar o interesse do meio fotográfico para esses trabalhos, que vêm trazendo várias questões reveladoras para a fotografia. Não foi à toa, por exemplo, que vimos vários fotógrafos que possuem um trabalho consolidado no mercado desenvolvendo estudos acadêmicos em paralelo. Essas coisas não são dissonantes, trazem outros ares para o próprio contexto da academia e enriquecem o fazer fotográfico. É um ganho coletivo que precisamos incentivar.

Amanhã eu comento sobre as demais mesas do evento. Deixei para falar delas juntas porque há uma complementariedade da discussão!

Cheiro grande!!!

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Uma resposta para Diário de Bordo – I Encontro Pensamento e Reflexão – Pensar para evitar a anestesia

  1. Infelizmente não pude estar físicamente presente, mas acompanhei quase tudo pela streaming que, no geral, funcionou super bem. É até importante destacar isso, porque possibilita uma democratização do acesso e da participação. Faço coro para este material se tornar acessível de outras formas também!
    Realmente, Aninha, um dos muitos pontos altos deste lindo evento foi exatamente este diálogo e proximidade com o pensamento acadêmico, que se mostrou tão acessível e consonante. Foi gostoso ver discursos mais elaborados e complexos, cheios de referência, de outras mais leves, práticas e dinâmicas, mas nem por menos intelectuais. Acho que houve um equílibrio, que para mim foi gratificante.

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