Alice Miceli é uma artista visual que trabalha temas relacionados a fatos históricos e sociais, dialogando com a ciência e a tecnologia, o que resulta numa poética que nos fala, principalmente, da nossa memória.
Essa imagem é um frame do trabalho 88 de 14 mil, onde Alice apresenta 88 retratos de identificação, selecionados no arquivo fotográfico da antiga prisão S-21, em Phnom Penh, capital do Camboja, onde 14 mil pessoas foram executadas pelo regime do Khmer Vermelho nos anos 70.
No vídeo, as imagens permanecem longos períodos na tela, lembrando a espera dos prisioneiros pela morte, e correspondem as horas ou dias decorridos da entrada na prisão, quando era tirada a foto, até a execução.
Apesar de disponível na rede, não consegui assistir ao trabalho. Saber do cuidado que a artista teve em calcular um quilo de areia para cada de dia de vida na S-21 e da projeção dos retratos numa parede de areia, me causou uma grande repulsa pela imagem. Como se o correr do tempo, demarcado pela areia, e a sua aparência arenosa me colocasse frente a frente com a morte de um maneira muito crua.
Em oposição a enxurrada de imagens clichês que diariamente invadem nossos olhos, tenho a sensação que essa é uma imagem porosa, que vai aos poucos se misturando conosco para nos dizer das barbaridades que somos capazes de fazer enquanto seres humanos.
E ao refletir sobre ela, percebo em mim um silêncio marcado pela cicatriz, machucado pela dor do outro, que também é minha, e que dói a cada mudança do tempo.
Parece que o vento parou de soprar e agora eu sou só silêncio.
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